A Guerra de Secessão

Por volta de 1857, um sulista americano reclamava: — "Nós, homens do Sul, não passamos de escravos dos nortistas. Dependemos deles para tudo. Nossas roupas são feitas com tecidos comprados no Norte. Os livros de nossos filhos vêm todos de lá. Quando adoecemos, tomamos remédios do Norte, para continuar vivendo segundo a política que os nortistas determinam. E até a mortalha na qual seguimos para o além, também é trazida do Norte."

Início da guerra de Secessão: bombardeamento do Forte Sumter pelas tropas confederadas, na noite de 12 de abril de 1861
Início da guerra de Secessão: bombardeamento do Forte Sumter pelas tropas confederadas, na noite de 12 de abril de 1861.

A dominação econômica dos nortistas era uma pedra no sapato dos sulinos. Mas em vez de enfrentá-la adaptando-se às exigências dos tempos modernos através da industrialização, o Sul permanecia estagnado em seu apego à agricultura e ao tradicionalismo.

Quando os republicanos do Norte começaram a pregar a abolição da escravatura, os fazendeiros sulinos — grandes proprietários de escravos — acharam que o abuso passara dos limites. Revoltando-se contra o governo do país, decidiram viver por conta própria. Mas a separação, uma vez concretizada, não conseguiu eliminar a rivalidade e acalmar os ânimos. Ao contrário, acabou levando À guerra civil.

O desenvolvimento e a tradição

As diferenças entre Norte e Sul começaram a partir do momento em que os Estados Unidos se tornaram independentes da Inglaterra, com a formação de duas zonas de atividades econômicas diversas. Ao norte, os núcleos artesanais se expandiram e ramificaram, originando grandes parques de indústria. Com o crescimento da produção, agruparam-se ali enormes massas de trabalhadores assalariados e o comércio ganhou importância. Multiplicaram-se as estradas de ferro, os pontos e as linhas telegráficas, e isso veio acelerar ainda mais o desenvolvimento.

Enquanto isso, o Sul permaneceu apegado à agricultura por métodos antigos e ineficientes. Aproveitando-se da fertilidade das suas terras, os sulistas se limitaram a estabelecer grandes propriedades agrícolas — dedicadas quase exclusivamente ao cultivo de algodão. Quando a expansão das fazendas ocupou os melhores terrenos da região do Atlântico, as lavouras começaram a se estender para o oeste. A vitória americana na guerra contra o México, em 1847, proporcionou aos fazendeiros sulistas nova área de colonização: os territórios do Texas, Arizona, Novo México e Califórnia. Com isso, a monocultura algodoeira tomou conta de toda a faixa sul dos Estados Unidos. Como a mão de obra escrava permitia produzir a custos muitos baixos, os grandes proprietários não se interessavam pelas inovações da técnica agrícola. Mecanizar e modernizar eram assuntos alheios às suas cogitações. Industrializar, especialmente, era ideia que nem lhes passava pela cabeça.

Em consequência, o Sul se mantinha numa profunda dependência do Norte. Incapaz de produzir industrialmente para seu próprio consumo, via-se forçado a recorrer aos produtos nortistas — pagando sempre os preços que os industriais achassem conveniente cobrar.

Quando no Norte iniciou-se a campanha abolicionista, o descontentamento dos sulinos chegou ao auge. Consideravam inaceitável perder a comodidade representada pelos trabalhadores escravos (cerca de 4 milhões), que eram a mola mestra da cultura de algodão. Mas os industriais nortistas tinham urgência em emancipar os negros, pois somente depois de libertos poderiam ganhar salários e constituir um mercado para os produtos manufaturados. Desse conflito de interesses originou-se uma tensão enorme e a eleição do abolicionista Abraham Lincoln para a presidência do país foi a gota d'água que fez transbordar o copo. De nada adiantou o novo presidente afirmar que não pretendia extinguir a escravidão nos estados onde ela já existisse. Os fazendeiros preferiram que independesse das promessas dos outros e escolheram o caminho da separação. A guerra veio em seguida. Ninguém previu que seria tão longa e tão sangrenta.

O forte da resistência

Em dezembro de 1860, as autoridades do estado de Carolina do Sul rebelaram-se contra o governo da União e declararam sua independência. Logo depois, em janeiro, outros estados sulinos seguiram o exemplo. Sob o nome de "Estados Confederados da América do Norte", a Carolina do Sul, a Flórida, a Georgia, o Alabama, o Mississippi, a Luisiana e o Texas se reuniram e elegeram um governo provisório, chefiado por Jefferson Davis. Sua primeira providência foi determinar o arriamento da bandeira da União em todos os quartéis militares do Sul. Por toda parte a ordem foi cumprida. Somente o Forte Sumter, na Carolina do Sul, manteve o pavilhão hasteado. Os confederados não gostaram: estacionaram tropas ao redor do Forte, certos de que esse se renderia. Mas a guarnição de Sumter resistiu. E o cerco se prolongou até 12 de abril de 1861, quando finalmente a artilharia pesada sulista interrompeu a resistência, derrotando os legalistas.

A notícia do bombardeamento do Forte Sumter indignou os nortistas. Quando Abraham Lincoln, presidente dos Estados Unidos, apelou ao povo pedindo voluntários para combater os revoltosos, recebeu em resposta 300.000 homens.

A força da União

No Sul, os estados de Virgínia, Arkansas, Tennessee e Carolina do Norte uniram-se aos confederados, aumentando para 11 o número dos estados rebeldes, cuja população atingia 9 milhões de pessoas.

O exército organizado pelos rebeldes era muito mais eficiente do que as tropas da União. Além disso, seu comandante era um militar de grande talento: o general Robert E. Lee.

Embora militarmente despreparado, o Norte estava em melhores condições para enfrentar a guerra do que os confederados. Reunindo 23 estados, com 22 milhões de habitantes, a União dispunha de uma economia sólida, baseada na indústria. Sua agricultura, já mecanizada em parte e menos dependente do trabalho braçal que a sulina, continuou a produzir a despeito da mobilização de homens para o exército. Seu comércio internacional se manteve inalterado, pois o governo legalista tinha o apoio de todas as grandes nações europeias.

Ainda assim, a despeito da desigualdade das forças, a Guerra de Secessão se prolongou por 4 anos, durante os quais envolveu 4 milhões de homens e consumiu cerca de 10 bilhões de dólares.

O bloqueio e as batalhas

A campanha militar da Secessão se desenvolveu em três frentes principais: o mar, os estados da costa atlântica e o vale do rio Mississippi.

A marinha permaneceu fiel à União e desempenhou durante toda a guerra um papel fundamental.. Graças ao bloqueio naval das costas do Sul, os rebeldes ficaram sem contato com o exterior e se viram duplamente tolhidos: além de não poderem importar armas, munições e medicamentos para o prosseguimento da guerra, ficaram impossibilitados de exportar o algodão para financiá-la.

Em terra, a campanha demorou a se definir. Ora os sulistas dominavam as operações, ora a vantagem passava aos nortistas. Durante os primeiros dois anos da guerra, as tropas do general Lee conseguiram vitórias expressivas, mas ao fim de 1862 os nortistas se reorganizaram e passaram a conquistar posições. O comando das tropas da União, que estava em mãos de vários generais, passou à responsabilidade do General Ulysses Grant. A partir de então, a campanha começou a favorecer o Norte. Em 1863, as forças combinadas dos generais Sherman e Grant derrotaram os confederados em Chattanooga. Durante o ano de 1864, os nortistas consolidaram sua vantagem através de uma série de operações. Em princípios de 1865, o território rebelde já se achava reduzido aos estados da Carolina do Sul e Virgínia, mas a guerra prosseguia. Finalmente, as tropas legalistas conseguiram tomar Richmond, último reduto dos rebeldes, que caiu a 3 de abril de 1865. O general Lee retirou-se para uma cidadezinha próxima e, a 9 de abril, capitulou definitivamente. A paz foi assinada.

As perdas e os danos

Ambos os lados sofreram baixas pesadíssimas. Mais de 600.000 homens foram mortos. O número de feridos e mutilados ultrapassou a casa do milhão. Além dos prejuízos humanos, a Guerra de Secessão sacrificou a economia americana.

Dois anos antes da rendição das tropas sulistas, a 1 de janeiro de 1863, Lincoln assinou a abolição definitiva da escravatura. Não chegou, porém, a ver a sua concretização, foi morto por um sulista descontente, dois dias após a rendição dos confederados.

Os inconformados

A luta civil marcou profundamente o povo americano. Durante muito tempo seus vestígios permaneceram visíveis nas relações entre o Norte e o Sul, e sem dúvida devem ser levados em conta para explicar a origem da tensão racial que marcou, desde então, a evolução e a vida dos Estados Unidos.

Com a guerra, a produção algodoeira americana ficou seriamente prejudicada. Isso determinou a elevação do preço do produto no mercado mundial, o que levou vários países a se tornarem algodoeiros de uma hora para outra. No Brasil, surgiram grandes lavouras no Maranhão. Mas o ciclo da euforia maranhense passou logo: terminada a guerra, os Estados Unidos retomaram sua posição de grandes produtores e a cotação do algodão brasileiro perdeu a expressão que tivera.

Houve muitos sulistas que não se conformaram com a derrota. Habituados à escravidão do negro, não se adaptaram à ideia de vê-lo livre e posto em nível de igualdade com os brancos. Para escapar às exigências da nova legislação, organizaram a Sociedade de Colonização do Sul, que promoveu a emigração para o Brasil, onde ainda vigorava a escravatura.

Cerca de 3.000 pessoas vieram para cá, distribuindo-se pelo Pará e Espírito Santo. A maior parte, entretanto, concentrou-se no estado de São Paulo, estabelecendo núcleos de povoamento, entre os quais destaca-se Americana, hoje importante cidade industrial do interior paulista.

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