sábado, 17 de dezembro de 2022

Piratas: Os ladrões do mar

"Chegamos ao Panamá. Do alto de uma colina, comtemplamos por longo tempo o local de onde dizem que provém todo o ouro do mundo. Avistamos, no porto, a frota espanhola do Pacífico, com embarcações carregadas de ouro do Peru.

O capitão apontou para a baía dizendo: 'Olhem! Ali os espanhóis carregam seus galeões. Algum dia ainda hei de passar por lá, com todas velas desfraldadas. Quem me acompanhará nessa jornada?' Sem hesitar, o lugar-tenente Oxenham respondeu: 'Capitão Drake, mesmo que me enxotásseis a golpe de açoite, eu vos seguiria!"

Assim escrevia em seu diário um dos dezoito marinheiros que se haviam embrenhado no istmo do Panamá, em 1573. Aí se encontravam para surpreender e pilhar as expedições espanholas que, carregadas de fabulosas riquezas, se dirigiam rumo à costa atlântica.

Embarcações piratas.
Embarcações piratas.

Os dezoito marinheiros, sob o comando do capitão Drake, integravam a tripulação que desembarcara, de duas naves inglesas, numa ilha desabitada no mar das Antilhas. O capitão organizara a expedição com o consentimento da rainha Elizabeth I, da Inglaterra, que frequentemente se servia dos piratas para enfraquecer o poderio colonial espanhol. Elizabeth, que reinou de 1558 a 1603, concedia aos capitães uma "patente de corso", documento com o qual a coroa inglesa legalizava a pirataria, desde que a serviço de Sua Majestade.

Francis Drake, o mais famoso corsário da história.
Francis Drake, o mais famoso corsário da história.

O nome desse documento originou a denominação de corsários, aplicada a todos marinheiros que participavam de tais empresas. A partir de meados do século XVI e durante todo o século XVII, inúmeros navios corsários, principalmente ingleses, mas depois também franceses e holandeses, sulcaram o mar das Antilhas para pilhar os galeões espanhóis ou saquear as cidades costeiras das colônias espanholas.

No início do reinado de Elizabeth, a "guerra de corso" era encorajada de todas as maneiras. A rainha protegeu e financiou, além de Drake, muitos outros piratas famosos como Thomas Cavendish, John e Richard Hawkins, Martin Frobisher, Walter Raleigh, George Clifford, nobilitando muitos deles. Também Luiz XIV, rei da França, distinguiu o corsário Jean Bart com um título nobiliárquico.

Piratas no Rio de Janeiro

Nos séculos XVII e XVIII, o Brasil também foi alvo de incursões de piratas e corsários, principalmente franceses. O Rio de Janeiro foi um dos pontos mais visados. Uma das ocorrências mais conhecidas deu-se em 1710. O francês Duclerc desembarcou com mil homens e tentou apossar-se da cidade. Rechaçado, foi aprisionado e morto logo depois. Sob o pretexto de vingá-lo, o comandante francês, René du Guay-Trouin, mais conhecido por Duguay-Trouin, aportou ao Rio com quase cinco mil homens. Derrotou a guarnição local, pondo em fuga o governador e a população. Para retirar-se exigiu um grande resgate, no que foi atendido. Um mês após, voltou à França.

Leis da Pirataria

A vida dos piratas, seus direitos e deveres com relação aos companheiros ou aos inimigos, eram regulados por normas preestabelecidas, chamadas "contratos de fretagem".

Estes homens, capazes de toda espécie de atrocidades, comportavam-se entre si como verdadeiros irmãos, fiéis e obedientes às leis que determinavam sua conduta. Desta união e disciplina férrea resultava uma força quase invencível.

A cada marinheiro cabia uma quota do produto do saque, aumentada em caso de ferimento. Cada ferida tinha o seu preço. Por exemplo, a perda de ambos os olhos ou das pernas valia um prêmio de 600 moedas; a perda do polegar ou indicador da mão direita, ou de um olho, 300 moedas; qualquer outro dedo valia 100 moedas.

Muitas vezes, uma associação particular ou um "cavaleiro" colocava navios e equipamentos à disposição dos piratas. A estes financiadores de corsários cabia a terça parte do saque.

A vez dos bucaneiros

Em meados do século XVII, o poderio marítimo espanhol enfraqueceu sensivelmente, o que bastou para que também diminuísse a pirataria "patrocinada". Surgiram em seu lugar as empresas particulares de pirataria, principalmente nas imediações das ilhas e costas do mar das Antilhas, onde sempre havia algum navio ou cidade costeira para atacar.

Mapa das Antilhas
Mapa das Antilhas.

Assim apareceram os "bucaneiros". Inicialmente, tal nome fora dado aos habitantes brancos do Haiti que, vindos dos mais variados países, haviam se estabelecido na ilha como colonos. Tinham o hábito de defumar a carne em um "buncan", isto é, um defumador constituído de estacas de madeira. Do termo "buncan" derivou o apelido "bucaneiro", que veio a ser outro sinônimo de "pirata".

Originalmente, esses colonos eram caçadores e pastores. Mais tarde, a ilha foi de tal forma saqueada e arrasada pelos espanhóis, que escassearam os animais de caça e as atividades agropastoris tornaram-se difíceis. Não encontrando nas matas outros recursos para viver, os bucaneiros passaram a procurá-los fora da ilha, principalmente no mar. Seguindo o exemplo de Drake e seus homens, tornaram-se piratas: ao invés de animais, passaram a caçar galeões. Os ingleses que se encontravam entre eles, eram chamados "freebooters", o que significa "saqueadores livres", por não mais dependerem da coroa inglesa. Daí derivou o termo francês "flibustier" e o português "flibusteiro". Durante algum tempo, os termos "bucaneiro", "corsário" e "flibusteiro" eram diferenciados; mais tarde passaram a designar, sem distinção, qualquer espécie de pirata.

O refúgio predileto dos bucaneiros foi, por longo tempo, uma ilha que só dispunha de um caminho de acesso e era cercada de costas íngremes. Seus descobridores compararam-na ao casco de uma enorme tartaruga e, assim, deram-lhe o nome de Tortuga (tartaruga em espanhol), que conserva até hoje. Tortuga pertence atualmente à Venezuela.

Desse refúgio e de muitos outros situados nas costas da Jamaica, e mesmo no alto mar — como ocorria, por exemplo, com a ilha brasileira de Trindade — saíram as expedições dos mais importantes e cruéis bucaneiros e corsários daquela época: Bartolomeu Português, "o invencível", que terminou seus dias vendendo cocos e nabos nas estradas de Tortuga; Francisco Nau, um francês cognominado "o Olonês", que teria sido devorado por canibais; Henry Morgan, chamado "o rei dos bucaneiros", autor de empreendimentos que causaram espanto e temor, e que chegou a vice-governador da Jamaica, por nomeação da rainha Elizabeth I; Anne Bonney e Mary Read, as mais famosas mulheres piratas. Estes piratas que gostavam de denominar-se "Irmãos da Costa", por mais de meio século semearam o terror pelas colônias espanholas da América Central, do México e das costas setentrionais da América do Sul.

A pirataria, porém, não nasceu no século XVI e não acabou no século XVIII. Ela é conhecida desde os tempos mais remotos, e de certa forma existe até hoje. Foram os gregos antigos que lhe deram o nome: "peirates", o que quer dizer "ladrões do mar". Realmente, a pirataria era sempre praticada por mercenários cujo objetivo era a pilhagem, o roubo, o saque. Mas este tipo de pirataria desapareceu mesmo dos mares do sudeste asiático, onde se manteve por mais tempo. Hoje é chamado de pirataria qualquer atentado às leis da paz ou da guerra, cometido nos mares. Por outro lado, em decorrência dos bombardeios aéreos das cidades indefesas, surgiu o termo "pirataria aérea". O conceito tradicional da pirataria já pertence ao passado.

Vestimentas

Muitos livros e filmes mostram as aventuras de piratas, representando-os com roupas magníficas, deslumbrantes túnicas vermelhas, grandes faixas em torno da cintura, calças enfiadas em enormes botas, chapéus emplumados, de abas largas. Isso porém, não corresponde à realidade, especialmente no caso dos piratas das Antilhas, que navegavam sob o sol ardente dos trópicos. 

Vestimenta típica dos piratas.
Vestimenta típica dos piratas.

Suas roupas eram mais simples. Traziam na cabeça um chapéu esgarçado, sobre um turbante colorido. Como vestimenta, usavam uma camisa rústica e uma calça de couro ou de pano grosseiro. Em volta da cintura, colocavam uma correia ou faixa, onde eram enfiadas as pistolas e o insubstituível cutelo (faca de ferro, semicircular). Argolas nas orelhas, tatuagens nos braços e no peito completavam a figura.

Táticas de combate

Mesmo a grande distância, era difícil que qualquer navio passasse despercebido aos piratas. Durante as travessias, toda a tripulação mantinha-se constantemente atenta, pois o primeiro marinheiro a divisar a presa teria direito a um prêmio. Quando avistavam uma vela, todos tomavam suas armas e corriam para os postos de combate. Os que estavam armados de mosquete colocavam-se na proa, enquanto outros se estendiam sobre o passadiço do navio, para não serem vistos. O timoneiro, a toda velocidade, conduzia a embarcação no rastro da outra, a fim de que somente um alvo estreito se apresentasse aos eventuais disparos inimigos. Mas os atos de defesa eram raros. Rapidamente, os piratas aproximavam-se do navio atacado, prendendo-o por meio de ganchos de abordagem. A uma ordem do capitão, saltavam sobre o passadiço da presa e saqueavam tudo o que encontravam de valioso a bordo.

Um combate pirata.
Um combate pirata.

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